quinta-feira, 15 de abril de 2010

Percepção da realidade


Percebi que não são os comprimidos, as gotas e as injeções os verdadeiros remédios que atingem o centro dos distúrbios da emoção e do sentimento humano. Compreendi também que a grande maioria das alterações do psiquismo não são causadas por bactérias, vírus, desvios bioquímicos e processos degenerativos. É a própria ausência da igualdade de oportunidades e de solidariedade que produz e mantém as chamadas “doenças mentais”. Acredito que o amor e a generosidade, quando acompanhados de um sólido conhecimento científico e empenho pessoal, são mais eficazes e produzem resultados certamente mais efetivos.

Concluí - como muitos outros profissionais já o fizeram - que o falso discurso científico, que o lucro voraz obtido com o comércio de medicação psiquiátrica, que a prática de manter pessoas semi-sedadas com o uso de ansiolíticos, tranqüilizantes e antidepressivos são resultado de uma mentalidade individualista e consumista que altera a convivência saudável e impede a manutenção de uma vida equilibrada.

 Como um cavalo que quebra a perna e não serve mais para o trabalho, o “nervoso” e o “doente mental” têm o mesmo destino: o abandono. Os donos do saber os condenam ao uso interminável de drogas para “aliviar” seus protestos; os desenganam preconizando a sua morte social, até não possuírem mais dinheiro para manter a indústria da doença.

As falsas técnicas e conceitos alardeados por comerciantes de livros, religiões salvadoras e cursos de auto-ajuda, funcionam como ópio para a esperança dos que acreditam na prosperidade súbita, no autoconhecimento mágico, no empírico poder da mente e em muitos outros “pacotes lucrativos”. O comércio da venda de ilusões para a multidão de decepcionados com a nossa civilização desequilibrada, gera acumulação de riqueza material e pobreza de espírito para aqueles que o gerenciam.

Atualmente é fácil constatar o pulular dos misticismos de diferentes matizes e de idéias e conceitos híbridos em que uma combinação de pseudociência, religião e ocultismo se misturam, compondo um verdadeiro “coquetel salvador” para os sem esperança. Apregoam as “energias positivas” (?), os encontros miraculosos com a felicidade, com a harmonia cósmica, com o sucesso individual. Pirâmides, cristais, gnomos e mapas astrais mantêm as ilusões na crença de um mundo melhor, onde cada um, individualmente, possa encontrar as soluções mágicas desejadas para si. Essas fórmulas, quase sempre, não premiam as soluções realistas para a vida coletiva; enquanto isso, a sorte ou azar dos apostadores aumentam o comércio e a produção das quinquilharias ligadas a essas viagens da imaginação.

Ninguém está disposto a construir o mundo da convivência sob parâmetros realistas. É preferível sonhar! O alicerce da realidade, que sustenta os sentimentos, princípios e valores coletivos exige esforço e não dão lucros. Ninguém quer ser, a maioria quer obter. Isso me leva a compreender porque na vida social dos indígenas não circulam o lucro, as fantasias materialistas, as desigualdades e a violência. Talvez eles tenham descoberto, há milênios, que para conviver humanamente e produzir bem-estar basta sentir, pensar e agir coletivamente. Não vi “nervosos” nem “doentes mentais” entre eles; talvez porque, no mundo deles, a razão da Vida esteja apontada para a direção correta da convivência humana solidária, onde o todo vale mais do que a parte. A parafernália civilizada deve ser vista por eles como um hospício: de um lado os normais poderosos, de outro, os loucos desesperados. É possível que um dia acordemos dos nossos sonhos e, por sobre nossos castelos de areia, possamos construir uma nova civilização sob o alicerce sólido da realidade coletiva.

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